Primo Levi: Se isto é um homem
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Sabemos que, quanto a isto, dificilmente nos compreenderão,
e é bom que assim seja. Mas considere cada um quanto valor, quanto significado
está contido mesmo nos nossos mais pequenos hábitos quotidianos, nos nossos mil
objetos que até o mendigo mais humilde possui: um lenço, uma velha carta, a
fotografia de uma pessoa amada. Estas coisas fazem parte de nós, quase como se
fossem membros do nosso corpo; não podemos sequer pensar em sermos privados
delas, no nosso mundo, pois imediatamente encontraríamos outras para substituir
as velhas, outros objectos que são nossos porquanto guardam e suscitam memórias
nossas.
Imagine-se agora um homem ao qual, juntamente com as pessoas
amadas, tiram a casa, os hábitos, a roupa, enfim, tudo, literalmente tudo
quanto possui: será um homem vazio, reduzido ao sofrimento e à carência,
esquecido da dignidade e bom senso, pois acontece facilmente, a quem tudo
perdeu, perder-se a si próprio; reduzido a tal ponto, que outros poderão sem
problemas de consciência decidir a sua vida ou da sua morte para além de
qualquer sentido de afinidade humana; no caso mais optimista, na base de uma
mera avaliação de utilidade. Compreender-se-á então o duplo significado da
expressão <>, e será claro o que entendemos
exprimir com esta frase: jazer no fundo.
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