E olho estupefacto para aquela nova entidade
que o meu amigo parece assumir, e pergunto-me se não é tudo uma armadilha de
ilusão. Todo ele surge mais altivo do que eu, naquele preciso momento, e eu de
assombro: sou só um pensamento indivisível e impagável, um arrepio que sobe
espinha acima, que arrelia a pele. Um espanto medonho deixa-me inerte num
espaço de tempo, à medida que uma realidade me trespassa e me corrói as
entranhas. A realidade daqueles que mergulhados na lama, cospem orgulhos mesquinhos e dignidades apensas e se
atiram à vida, só assim. E ela com eles, e a meio relevo, edificam a alma
humana. E peles de susceptibilidade caem, inúteis e desprezadas, rasgadas como trapos velhos, de não servirem
para o que é prático e mineral.
A
chuva continuou a cair, solene e lúgubre. Sinto a presença forte do meu amigo,
ao meu lado, batalho contra as palavras a dizer, e lentamente deixo de olhar o
fundo da rua para mirar aqueles olhos de
um castanho escuro que nada diz, que nada deixa dizer, olham para mim como
acendalhas de um fogo de sofrimento secular pela vida...
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