Ainda oiço a voz da minha mãe, usada naquela forma
apreensiva e preocupada. Tantas vezes a usa daquela forma para mim, tornando-me
repleto de preocupação e receio antes de
descobrir que a intensidade da sua voz não corresponde ao peso do real. Lembro-me do "baque" possuído de
frenesim pela sua aliança, ao bater na ombreira da porta.
-Alberto, é para ti, vai ao telefone!
Ainda de olhos fechados, ouvia, sem querer ver o momento. Embriagado de cansaço.
Fechado, sobre o calor dos lençóis, da manhã fria. Então, com tremor e preocupação, ouvi as
palavras do meu pai ao telefone.
-"Sim..."-disse ele, um "sim" que só previa desolação e miséria, parecendo
de alguma maneira que já previa o que lhe iam dizer.
-"Não me diga isso...Não me diga isso!" - Repetiu.
Algo naquela figura que sempre conheci como imponente e inquebrável, parecia
estar a desfazer-se, a cair, como um castelo de vidro. O inesperado vergava-o
como nunca fora vergado. E os meus olhos inquietos logo acordaram e olharam em direcção à porta entreaberta do meu quarto. Desonesta e maldita, por me impedir
de ver um momento intrínseco na vida, mas por estar entre aberta deu-me uma
esperança traiçoeira de ver alguma coisa que fosse. Lembro-me apenas de palavras, murmúrios entre o meu pai e a minha mãe antes de ter sido vencido pelo cansaço.
Mas depois, ao almoço, exaltado pela curiosidade cheguei à
cozinha, onde estava o meu pai que me disse:
-Sabes o que aconteceu?
-Não. - disse eu, percorrendo rapidamente na minha cabeça todas as hipóteses que tinha considerado. Nada preparado para o que vinha aí.
-O Lopes faleceu, pá. Teve um ataque cardíaco. Já viste
isto? Já viste?
E depois chamado pela minha mãe se afastou, deixando-me por
ali em choque.
Ao estarmos a comer, qualquer coisa de almoço, só me vinha à cabeça: "O Lopes
morreu. O Lopes morreu. O Lopes morreu."
...
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